As contribuições da teoria de Vygotsky e a prática psicopedagógica

Indubitavelmente, a prática psicopedagógica pode ser substancialmente qualificada quando assume como um de seus referenciais a teoria de Vygotsky. Na busca por compreender os aspectos envolvidos na aprendizagem, a prática psicopedagógica, encontra no pensamento vygotskyano uma importante e inesgotável fonte de contribuições para beneficiar àqueles que necessitam superar as dificuldades no processo de aprender.

A psicologia sócio-histórica e a abordagem sócio-interacionista de Vygotsky apresentam a compreensão de que o ser humano se constitui nas relações sociais estabelecidas entre os indivíduos e de que o pensamento é constituído em um ambiente histórico e cultural. Além disso apontam que nos processos de interação, vivenciados pelas gerações, são construídos e desenvolvidos, os instrumentos físicos e ou simbólicos, mediadores da relação estabelecida entre os seres humanos e a realidade. Sendo a linguagem o principal instrumento simbólico de representação, é por meio dela que a transformação das funções psicológicas elementares será transformada em funções psicológicas superiores. 

Esses aspectos, indubitavelmente, têm grande importância para a prática psicopedagógica. Aproveitamos as considerações de Martins para identificar o grau de importância que tem esses conceitos desenvolvidos pelo pensamento vygotskyano.

A passagem das funções psicológicas elementares para as superiores ocorre, portanto, pela mediação proporcionada pela linguagem que, na abordagem vygotskyana, intervém no processo de desenvolvimento intelectual da criança desde o momento de seu nascimento; por si só, a criança não se apropria qualitativamente dos conhecimentos desejáveis que alcança por meio de interações profícuas com os elementos mais experientes do seu grupo social. A linguagem do meio ambiente, que reflete uma forma de perceber o real num dado tempo e espaço, aponta o modo pelo qual a criança apreende as circunstâncias em que vive, cumprindo uma dupla função: de um lado, permite a comunicação, organiza a medeia a conduta; de outro, expressa o pensamento e ressalta a importância reguladora dos fatores culturais existentes nas relações sociais. (p114-115)

As práticas de mediação e interação são preciosas para as intervenções psicopedagógicas. Na sala de aula e na escola elas qualificam o processo de desenvolvimento, especialmente, quando valorizam as ações que são propostas considerando a Zona de Desenvolvimento Proximal dos alunos. O professor que assume uma postura mediadora no processo de intervenção pedagógica e oportuniza, na sala de aula, atividades que favoreçam a interação entre os alunos, qualifica o processo educativo. Para Martins, a escola é um lugar de apropriação e de sistematização de conhecimento e quando promove ambiente de interação, no qual alunos e professor envolvem-se motivados, contribui para o reconhecimento e o encantamento com a vida pessoal e a vida social e descobrem-se uns em meio à vida de outros. 

 

As contribuições da teoria de Vygotsky e a prática Psicopedagógica

 

Mas quando as práticas de mediação, propostas na escola ou vivenciadas no cotidiano, não são suficientes para promover a aprendizagem, elas podem ser especificamente recuperadas pela prática psicopedagógica com o objetivo de recuperar processos de aprendizagem perdidos e tratar os problemas de aprendizagem constituídos.

Podemos aprofundar o estudo sobre a mediação com as contribuições de Marta Kohl de Oliveira (1993). Com uma explicação bastante didática do pensamento de Vygotsky a autora trata da mediação simbólica e nos chama a atenção para a dedicação de Vygotsky ao estudo das funções psicológicas superiores ou processos mentais superiores que podem ser entendidos como os mecanismos psicológicos mais sofisticados, mais complexos que são típicos do ser humano.

A possibilidade de se pensar em objetos ausentes, imaginar situações nunca vividas, planejar eventos, são exemplos de atividades psicológicas superiores que se diferenciam de processos psicológicos elementares identificados em ações reflexas e ou automatizadas, como o movimento de cabeça que fazemos ao ouvir um barulho forte, inesperado.

Muitas vezes, os problemas de aprendizagem podem ser originados pela dificuldade do indivíduo no desenvolvimento das suas atividades psicológicas superiores. A ausência de condições de imaginar objetos ausentes e situações não vivenciadas, de planejar ações futuras e antecipar situações que possivelmente ocorram pode indicar para o psicopedagogo um caminho para o tratamento do problema de aprendizagem. Assim, as atividades que partem de processos psicológicos elementares podem favorecer o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. E isso ocorrerá quanto maior for o investimento do psicopedagogo em propostas de interação que possam mediar a relação do indivíduo com o seu meio.

No processo de aprofundamento dos estudos sobre as funções psicológicas superiores, Vygotsky confere importância para a mediação. Para ele, a mediação

  … é o processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação; a relação deixa então de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento (…) a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas, fundamentalmente, uma relação mediada. As funções psicológicas superiores apresentam uma estrutura tal que entre o homem e o mundo real existem mediadores, ferramentas auxiliares da atividade humana. (p.26 e 27) 

Identificamos dois tipos de elementos mediadores, conforme o que nos mostra Vygotsky: os instrumentos e os signos.

A partir de sua filiação teórica aos postulados marxistas, Vygotsky compreende o ser humano inserido numa sociedade que tem por base o trabalho e que por sua vez diferencia esse homem das outras espécies de animais. O ser humano, pelo trabalho, transforma a natureza e se une a ela criando a cultura e a história da humanidade. É no trabalho que o ser humano desenvolve a atividade coletiva, nas relações sociais, e cria e se utiliza, também, de instrumentos.

 

As contribuições da teoria de Vygotsky e a prática Psicopedagógica

O instrumento, conforme o que nos explica Oliveira (1993) é um elemento que se interpõe entre o trabalhador e o objeto de seu trabalho. Ampliando as possibilidades de transformação da natureza, o instrumento carrega em si a função para a qual foi criado e o próprio modo de utilização desenvolvido durante a história do trabalho, mediando assim a relação entre o indivíduo e o mundo (p.29).

Diferentemente, os signos para Vygotsky são instrumentos psicológicos. Nas palavras de Oliveira (1993) 

… são orientados para o próprio sujeito, para dentro do indivíduo; dirigem-se ao controle de ações psicológicas, seja do próprio indivíduo, seja de outra pessoa. São ferramentas que auxiliam nos processos psicológicos e não nas ações concretas, como os instrumentos. (…) Na sua forma mais elementar o signo é uma marca externa, que auxilia o homem em tarefas que exigem memória ou atenção. (…) Eles podem ser definidos como elementos que representam ou expressam outros objetos, eventos, situações. (p.30)

 

Assim, conforme Oliveira (1993) os estudos de Vygotsky e de seus colaboradores contribuíram para o entendimento da importância dos instrumentos e dos signos como elementos mediadores da relação estabelecida entre o ser humano e o mundo. Por constituírem funções psicológicas mais sofisticadas, os processos mediados por instrumentos e ou por signos estão diretamente ligados ao desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Por isso, esses processos de mediação, especialmente por signos, são caros para as práticas psicopedagógicas. É por meio deles que o indivíduo torna suas funções psicológicas superiores mais sofisticadas, condição fundamental para a solução dos problemas de aprendizagem.

Mas quando Vygotsky apresenta o conceito de mediação, por instrumentos ou signos, introduz um outro conceito, especialmente relacionado à função mediadora dos signos que é o conceito de processo de internalização. Conforme Oliveira (1993) o uso de signos, marcas externas, vão sendo internalizados pelos indivíduos e se organizam em sistemas simbólicos fundamentais para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Os conteúdos mentais que tomam o lugar dos objetos são um exemplo da internalização de signos. A autora aponta a linguagem como um exemplo de sistema simbólico básico, que para Vygotsky é constituído a partir da experiência vivida pelo indivíduo no mundo, do seu contato com a cultura que organiza o real. 

Contudo, para Vygotsky, a cultura não é considerada como algo pronto, e não é assimilada passivamente pelo indivíduo. Inserido numa vida social dinâmica, este indivíduo é ativo e seu mundo subjetivo interage com o mundo cultural, transformando a própria cultura e a sua própria constituição subjetiva.

Assim, conforme nos diz Oliveira (1993), as funções psicológicas superiores são encontradas nas relações sociais. Os elementos mediadores são fornecidos pelas relações estabelecidas entre os seres humanos e os sistemas simbólicos, especialmente, a linguagem, fundamental para a comunicação entre os indivíduos que possibilitam essas relações. 

Oliveira (1993) destaca a importância da relação entre o pensamento e o desenvolvimento da linguagem na teoria de Vygotsky. 

Conforme a autora, entre as duas funções básicas da linguagem, a principal delas é o intercâmbio social. É para se comunicar entre si que os seres humanos criaram a linguagem e essa necessidade de se comunicar provocou o seu desenvolvimento.

A segunda função, também muito importante: a de pensamento generalizante

A partir da ordenação do real, classificando as experiências vividas pelo indivíduo em categorias de conceitos, a linguagem se transformou em um instrumento de pensamento. É por meio da linguagem que o indivíduo organiza o real. É também por meio da linguagem que ele interage com o objeto de conhecimento. Por isso, a relação entre pensamento e linguagem é fundamental para compreendermos o funcionamento psicológico do ser humano.

Oliveira (1993) nos aponta a existência de uma fase pré-verbal no desenvolvimento do pensamento e uma fase pré-intelectual no desenvolvimento da linguagem antes de pensamento e linguagem se associarem no pensamento da criança. É por volta de dois anos de idade que o encontro do pensamento com a linguagem permitirá uma nova forma de funcionamento psicológico. Conforme Oliveira (1993), 

… a fala torna-se intelectual, com função simbólica, generalizante e o pensamento torna-se verbal, mediado por significados dados pela linguagem. (…) Quando os processos de desenvolvimento do pensamento e da linguagem se unem, surgindo, então, o pensamento verbal e a linguagem racional, o ser humano passa a ter a possibilidade de um modo de funcionamento psicológico mais sofisticado, mediado pelo sistema simbólico da linguagem. (p. 47) 

As contribuições da teoria de Vygotsky e a prática Psicopedagógica

 

Compreender que o pensamento verbal e a linguagem racional são a base de um funcionamento psicológico mais sofisticado é fundamental para tratar os problemas de aprendizagem. Práticas psicopedagógicas que desconsideram os aspectos envolvidos na constituição das funções psicológicas superiores poderão privilegiar ações que não favoreçam o desenvolvimento das mesmas.

Nessa perspectiva, ganha importância o significado como componente essencial da palavra. Como ato de pensamento, o significado é um ato de generalização. Conforme a teoria de Vygotsky, no significado da palavra estão unidos o pensamento e a fala, caracterizando assim o pensamento verbal. 

Mas Oliveira (1993) nos chama a atenção para a distinção que Vygotsky faz entre dois componentes do significado da palavra: o significado propriamente dito e o sentido. Conforme a autora, 

 

O significado propriamente dito refere-se ao sistema de relações objetivas que se formou no processo de desenvolvimento da palavra, consistindo num núcleo relativamente estável de compreensão da palavra, compartilhado por todas as pessoas que a utilizam. O sentido, por sua vez, refere-se ao significado da palavra para cada indivíduo, composto por relações que dizem respeito ao contexto de uso da palavra e às vivências afetivas do indivíduo. (p.50)

O entendimento de que o uso da linguagem desenvolve no indivíduo seu pensamento e seu discurso interior e de que, conforme Oliveira (1993), esse discurso interno, sem vocalização e voltado para o pensamento, tem a função de auxiliar as operações psicológicas do indivíduo é importante para compreender que primeiro a criança utiliza a fala com a função de se comunicar com os outros e somente depois ela vai desenvolver a linguagem como instrumento de pensamento bem como a internalização do discurso.

A identificação desses processos psicológicos, vivenciados pelo indivíduo, é fundamental para a prática psicopedagógica. Quando o tratamento do problema de aprendizagem considera que o uso da linguagem desenvolve no indivíduo seu pensamento e seu discurso interior terá condições de potencializar, por meio da interação, o desenvolvimento de sua linguagem e por consequência as suas funções psicológicas superiores.  

O processo de desenvolvimento de uma fala socializada para um discurso interno é marcado no desenvolvimento da criança pelo aparecimento da fala egocêntrica. Conforme Oliveira (1993), Vygotsky indica que 

 ao tomar posse da linguagem, inicialmente utilizada apenas com a função de comunicação, a criança passa a ser capaz de utilizá-la como instrumento (interno, intrapsíquico) de pensamento. Como esse processo é gradual, a fala egocêntrica aparece como um procedimento de transição, no qual o discurso já tem a função que terá como discurso interior, mas ainda tem a forma da fala socializada, externa. (p.52)

Mas, nesse aspecto, divergem explicitamente Vygotsky e Piaget. Conforme Oliveira (1993), para Piaget, a fala egocêntrica é “… uma transição entre estados mentais individuais não verbais, de um lado, e o discurso socializado e o pensamento lógico, de outro”. Seu entendimento é explicitamente oposto ao de Vygotsky.

Oliveira (1993) trata ainda dos conceitos de desenvolvimento e aprendizado, temas centrais no pensamento de Vygotsky. 

Mesmo não tendo formulado uma concepção estruturada do desenvolvimento humano com a qual fosse possível interpretar o processo de construção psicológica do nascimento até a fase adulta, Vygotsky oferece estudos importantes e dados de pesquisa sobre vários aspectos do desenvolvimento que devem compor a prática psicopedagógica. 

Para Vygotsky, é por meio do aprendizado, desde o nascimento, que se dá o desenvolvimento, especialmente, o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. O aprendizado possibilita o despertar de processos internos de desenvolvimento que ocorrem a partir do contato que o indivíduo estabelece com o ambiente cultural.

Mas é importante ter atenção para o conceito de aprendizado na teoria vygotskyana. Conforme Oliveira (1993), para Vygotsky, o aprendizado é  

“… o processo pelo qual o indivíduo adquire informações, habilidades, atitudes, valores, etc. a partir de seu contato com a realidade, o meio ambiente, as outras pessoas.  (…) por sua ênfase nos processos sócio-históricos, a ideia de aprendizado inclui a interdependência dos indivíduos envolvidos no processo. (…) o conceito em Vygotsky tem um significado mais abrangente, sempre envolvendo interação social.” (p.57) 

Contudo, para compreender as relações entre aprendizado e desenvolvimento deveremos dar atenção para um outro conceito importante na teoria vygotskyana: o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal.

A Zona de Desenvolvimento Proximal está diretamente relacionada com dois outros conceitos: o de Zona de Desenvolvimento Potencial e o de Zona de Desenvolvimento Real.

Para Vygotsky, a Zona de Desenvolvimento Real é caracterizada por funções psicológicas já bem estabelecidas em determinado momento da vida. Neste nível de desenvolvimento são considerados os processos de desenvolvimento já alcançados e consolidados.

Mas, para compreender o processo de desenvolvimento do indivíduo, Vygotsky chama a atenção para a Zona de Desenvolvimento Potencial que é caracterizado por funções psicológicas que podem ser estabelecidas com a ajuda de outros indivíduos mais capazes. Entretanto, não é qualquer indivíduo que pode se beneficiar da ajuda de outro indivíduo mais capaz. A condição de se beneficiar depende de seu nível de desenvolvimento que deverá possibilitar o aproveitamento da colaboração.

Assim sendo, a Zona de Desenvolvimento Potencial evidencia um momento do desenvolvimento que aponta as etapas posteriores, nas quais a interação com outras pessoas poderá afetar a ação do indivíduo.

Considerando, então, esses dois níveis de desenvolvimento, o real e o potencial, Vygotsky conceitua a Zona de Desenvolvimento Proximal como

… a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. (…) refere-se assim, ao caminho que o indivíduo vai percorrer para desenvolver suas funções que estão em processo de amadurecimento e que se tornarão funções consolidadas, estabelecidas no seu nível de desenvolvimento real. (…) é, pois, um domínio psicológico em constante transformação: aquilo que uma criança é capaz de fazer com a ajuda de alguém hoje, ela conseguirá fazer sozinha amanhã. (p.60)

 Portanto, é na Zona de Desenvolvimento Proximal que a intervenção psicopedagógica poderá ser mais profícua. 

Quando a escola, no processo de ensino-aprendizado, não considera como ponto de partida o nível de desenvolvimento real e que a proposta de ensino a ser seguida deverá considerar o nível de desenvolvimento potencial porque nele estão indicadas as possibilidades que a criança terá para avançar em seu desenvolvimento, tende a não proporcionar condições para que a aprendizagem ocorra. À atuação psicopedagógica caberá recuperar essas condições de aprendizagem seja, no trabalho direto com o indivíduo, detectando esses níveis de desenvolvimento, seja no estabelecimento de parceira com os profissionais da educação e ainda com o grupo familiar.

Oliveira (1993) adverte, contudo, para as interpretações equivocadas da teoria de Vygotsky. A necessidade de intervenção no processo de desenvolvimento não pode ser entendida com a necessidade de aplicação de uma pedagogia diretiva e autoritária. E nisso a intervenção psicopedagógica também será importante porque ela possibilitará a construção de possibilidades nas quais o indivíduo poderá recuperar suas condições de aprendizagem seja na escola, seja na vida cotidiana. 

Ainda no âmbito dos estudos sobre desenvolvimento e aprendizado podemos identificar um outro conjunto de colocações tão importantes: a evolução da escrita na criança. A escrita, entendida como um sistema simbólico de representação, está diretamente ligada aos temas da linguagem, mediação simbólica, uso de instrumentos, que são centrais na teoria de Vygotsky.

 

As contribuições da teoria de Vygotsky e a prática Psicopedagógica

 

Para compreender o desenvolvimento da escrita na criança, conforme Vygotsky, será necessário estudar a pré-história da linguagem escrita, como a criança pensa a escrita antes de estar submetida a processos deliberados de alfabetização. Para que ela seja capaz de compreender o funcionamento da língua escrita terá que descobrir que a mesma é um sistema de signos que representa uma outra realidade, que tem função instrumental, que é suporte para a memória e transmissão de ideias e conceitos.

Pertencendo ao grupo de estudos e pesquisa de Vygotsky, Luria observou, a partir da produção de diversas crianças um percurso para a pré-história da escrita:

– Rabiscos Mecânicos – correspondentes a imitação do formato da escrita do adulto;

– Marcas Topográficas – correspondentes a distribuição dos registros no espaço do papel;

– Representações Pictográficas – desenhos estilizados usados como forma de escrita;

Luria ainda chamou a atenção para a ideia de que o percurso da criança não é um processo individual e independente do contexto. A criança, ao contrário, interage com os usos da língua escrita que ela observa na vida cotidiana a partir dos quais elabora seu conhecimento a respeito do funcionamento dessa linguagem. Um trabalho psicopedagógico que objetiva a superação de problemas de aprendizagem da linguagem escrita não poderá desconsiderar esses aspectos.

Para tratar do processo de formação de conceitos e do papel desempenhado pelo ensino escolar nesse processo, Rego(2014) indica a distinção que Vygotsky faz entre os conhecimentos construídos na experiência pessoal e cotidiana das crianças, construídos pela observação, manipulação e vivência direta e os conhecimentos construídos na sala de aula, que não são observáveis de imediato e necessitam de interações escolarizadas, que possibilitarão diferentes graus de generalização, chamados de conceitos científicos. 

Para Vygotsky, é na puberdade que a combinação das funções intelectuais forma a base psicológica necessária para que o processo de formação de conceitos amadureça. Mas é fundamental que o ambiente externo forneça os desafios e estímulos ao adolescente. 

Assim, a escola desempenha um papel importante no processo de formação de conceitos. Especialmente, no processo de formação de conceitos científicos, a escola pode oferecer conhecimento sistemático de aspectos que não estão presentes na experiência direta, pode oferecer o acesso ao conhecimento científico produzido pela humanidade, pode estimular as crianças para que se conscientizem de seus próprios processos de construção de conhecimento. A prática psicopedagógica poderá ser uma aliada poderosa nesse processo de construção de conhecimento porque poderá auxiliar os professores na construção dos processos de ensino que favorecerão o desenvolvimento das funções psicológicas superiores chamando a atenção para a necessidade de práticas de mediação e interação.

Mas para além disso, Rego(2014) também trata da função da brincadeira no desenvolvimento infantil.

A autora indica que para Vygotsky o alargamento dos horizontes da Zona de Desenvolvimento Proximal pode ocorrer quando o brinquedo é considerado como uma importante fonte de promoção de desenvolvimento. Para ele, é através do brinquedo que a criança aprende a atuar cognitivamente. O brinquedo pode servir para a representação de uma realidade ausente, impulsiona a formação de conceitos e certamente favorece, por meio da atuação da criança em um mundo imaginário, o desenvolvimento da sua Zona de Desenvolvimento Proximal. Na ação psicopedagógica o brinquedo, sem dúvida, não poderá ser dispensado quando o foco for o desenvolvimento da formação de conceitos na infância.

Nessa exposição breve de conceitos relevantes da teoria de Vygotsky constatamos sua importância para a prática psicopedagógica. Conquistamos, a partir dela, mais um degrau de compreensão nesse campo rico e imenso que é a psicopedagogia. Ampliamos assim o entendimento de como deve ser constituída sua prática, comprometida e responsável. 

 

Referências

  • MARTINS, João Carlos. Vygotsky e o papel das Interações Sociais na Sala de Aula: reconhecer e desvendar o mundo. Ideias, nº28, p.111-122.
  • OLIVEIRA, Marta Kohl de. A mediação simbólica. In: Vygotsky. Aprendizado e Desenvolvimento: um processo sócio-histórico. São Paulo: Ed. Scipione, 1993.
  • _________________________. Desenvolvimento e Aprendizado. In: Vygotsky. Aprendizado e Desenvolvimento: um processo sócio-histórico. São Paulo: Ed. Scipione, 1993.
  • _________________________. Pensamento e Linguagem. In: Vygotsky. Aprendizado e Desenvolvimento: um processo sócio-histórico. São Paulo: Ed. Scipione, 1993.
  • REGO, Teresa Cristina. A função da brincadeira no desenvolvimento infantil. In: Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
  • __________________. O processo de formação de conceitos e o papel desempenhado pelo ensino escolar. In: Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.

Outras publicações